segunda-feira, dezembro 13, 2010


Entrevista com a estilista Gabriela Zuri

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Ontem eu postei sobre o curso de Moda e tudo o mais, então já que estamos falando sobre isso, resolvi postar hoje a entrevista que fiz com a Gabi Zuri, estilista da marca Cabotagem, famosa no sul do país. Conheci a Gabi lá no evento da Dijean NEO em agosto, e ela foi super fofa comigo, me deu altos conselhos! A entrevista está um pouco grande, mas com certeza vai ajudar a clarear a cabeça de quem está em dúvida. Vale a pena ler! :)


TREND-SE: Gabi, você é formada em Moda pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Como saber se eu sirvo pra fazer este curso também? Quais os requisitos básicos que tem que ter pra se dar bem nessa área?

GABI ZURI: Me formei em Dezembro de 2006 e apesar de sempre ter gostado muito de moda (e sentir que eu tinha talento pra isso), eu como toda menina de 17 anos tinha muito medo de encarar isso pro resto da vida. Sempre ficava aquela dúvida: "será que isso vai dar futuro?" ou "será que isso não é apenas um hobby?"... então acabava pensando em outras áreas como Publicidade ou Arquitetura, que são áreas, digamos mais "bem vistas". Então decidi: "Vou colocar na mão do destino", e prestei 2 vestibulares somente: Arquitetura e Moda. Aquele que eu passasse seria uma escolha do meu destino. Felizmente passei em Moda. Na verdade eu não sabia se servia pro curso, eu arrisquei. Durante o curso tive vááárias crises, sobre a certeza de ter escolhido o caminho certo, pois nunca fui exatamente a melhor aluna da sala. Via aquelas meninas tããão aplicadas, tão certinhas e isso fazia eu me sentir tão pequenininha que tinha vontade de desistir. Mas acabei aceitando que aquele era meu jeito e consegui conquistar muita coisa com ele. Nós nunca sabemos se servimos pra qualquer curso (a não ser que a gente tenha certeza do que quer desde criancinha) e somos obrigadas a escolher muito cedo, mas sou a favor de arriscar, de deixar vir de dentro da gente o que vai nos fazer feliz (e se teremos um bom salário, pois todo mundo tem contas a pagar. E felicidade não enche o cofrinho, né?! Rs!). Hoje eu consigo enxergar que era realmente Moda que teria que fazer, mas como todo mundo me senti insegura, é normal. O primeiro requisito que devemos ter é: não se iluda. Aquela moda linda das revistas e passarelas internacionais (e um pouco das nacionais), aquele conceito de "plumas e paetês" raramente vão sair das revistas e passarelas internacionais. O mundo real é bem diferente, tem ralação. Não tem paparazzis fotografando nosso look diário de trabalho (aliás raramente alguém vai reparar nele, então faça isso só pra você). Pra se dar bem na área, uma coisa extremamente importante (a mais) é a CRIATIVIDADE. Você vai precisar muito dela pra interpretar as macro e as micro tendências e adaptá-las à vida do seu público. Você é cobrada o tempo todo, e deve saber lidar muito bem com isso. Planejamento e Organização também são importantes. Feeling pra saber o que se adequa ao seu público, à sua marca... E claro, ler, ler e ler! Revistas, sites, blogs, livros... estar sempre informada com o que está acontecendo no mundo (não só da Moda! A economia mundial por exemplo, influencia diretamente a nossa área) ou o que já aconteceu nele, o que os especialistas e não especialistas pensam é sempre importante.


TREND-SE: O que você diria para uma adolescente que já sabe que quer fazer Moda, mas que tem medo da reação dos pais, de fazer e não arranjar um emprego ou simplesmente que não tem dinheiro para bancar o curso?

GZ: É normal alguns pais "assustarem" com esse tipo de decisão, afinal Moda sempre foi uma profissão vista como fútil (graças a Deus, isso está mudando) e algumas profissões como Direito, Medicina, Engenharia são bem mais respeitadas e claro que nossos pais sempre querem o melhor pra gente, sendo assim querem que tenhamos a melhor profissão e nem sempre enxergam isso na Moda. Meu pai ficou bastante incomodado com minha escolha, mas mesmo assim me deu todo o apoio que eu precisava. Minha mãe não se incomodou, deu muita força. A gente tem que saber negociar, sem bater o pé, sem querer impor, mostrar da melhor forma que é uma ótima profissão e que muitas vezes tem mais reconhecimento do que as citadas acima. E que também depende muito mais do profissional do que da profissão. Medo de não arranjar um emprego sempre tem, né? Além do índice de desemprego no país a concorrência na área é muito grande. Cabe a você fazer o seu melhor, ser a melhor profissional que se pode ser e se destacar no mercado. Um bom networking também é fundamental. O curso (apesar de eu ter feito em uma faculdade pública) é um curso relativamente caro. Digo isso por conta do custo de materiais. Meus professores sempre exigiram os melhores papéis pra desenhar, as melhores canetas pra pintar, gouaches, aquarelas, pincel feito da ponta do rabo da Marta macho do Sul da Nova Zelândia (rs), isso fora os livros, o computador, a impressora, o Trabalho de Conclusão de Curso, as peças (mini-coleções) que você tem que confeccionar durante o curso, é muita coisa! Então pra quem está meio sem grana o bacana é tentar uma faculdade pública, um financiamento estudantil, e arrumar um emprego/estágio pra quebrar o galho, né! Tem que se esforçar, nada vem fácil.


TREND-SE: Sendo estilista, o que você pode dizer sobre a profissão? Quais são suas funções básicas?

GZ: Pensa da seguinte forma: "de quem parte todo o trabalho dentro de uma confecção?". Do estilista, claro. É uma responsabilidade muito grande, pois eu tenho que pensar no trabalho de todo mundo (pelo menos aqui onde trabalho atualmente). Eu não posso deixar ninguém desabastecido, desde o desenhista até a menina que embala as peças prontas. Se faltar serviço pra alguém, a primeira pessoa que vão "culpar" sou eu. Então preciso ser muito organizada e estar sempre um passo a frente do resto do pessoal envolvido (aliás dois passos, pois imprevistos acontecem o tempo todo - tecido que não chega, aviamento que atrasa, funcionário que falta...). É bastante complicado. Minhas funções são muitas, rs.. Tem gente que pensa que eu chego e fico toda bonita sentada na frente do computador desenhando e pesquisando, mas é bem mais complicado. Eu tenho que fazer todas as pesquisas de tendências, cores, modelagens, formas, estampas, styling enfim... tudo. O planejamento inicial da coleção também é comigo. De mim partem os cronogramas, o mix de custos, o mix de peças. Recebo diariamente um monte de representante de tecidos, de aviamentos etc., então preciso além de programar a coleção, me organizar pra conseguir cumprir todos os meus afazeres diários, pois eu também tenho uma meta. Sou eu quem compra os tecidos/aviamentos da coleção, então preciso me programar pra data de chegada de cada um de forma que todos tenham um prazo pra ficar dentro do estoque, não podem ficar lá encalhados esperando a criatividade brotar (é, às vezes falha, rs). Preciso ficar atenta pra não faltar serviço pra ninguém, se não lá vem o chefe louco da vida que o corte está a toa, que as facções estão desabastecidas e vamos perdê-las pra outras fábricas... Tenho que dar suporte a modelagem, pilotagem, silk, bordado, desenhistas, corte, produção. Além do desenho propriamente dito: técnico e de estamparia. Sou eu quem tem que ficar cobrando as pessoas e também a mim, para que as coisas saiam na data prevista. Além disso eu tenho que fazer os custos das minhas pilotos e provar por A+B pro meu chefe que o que eu desenvolvi é viável comercialmente, tanto no custo quanto no modelo. E claro que algumas peças sempre são barradas (e o mais incrível é que justamente as peças que foram barradas, são as peças com mais apelo de tendência. Aí o chefe vê na loja do vizinho vendendo muito bem e vem aceleraaaando sua cabeça perguntando "por que você não avisou?!", rsrs!). Isso é um resumo, as coisas são muito mais complicadas, pepinos acontecendo diariamente de coisas que não tem nada a ver com você mas que caem no seu colo e um enfim de coisas. Fora a linguagem adaptável, pois você lida com pessoas de diversas classes sociais, culturas, etc. E você tem que saber falar a língua deles. É muita cobrança, é muita pressão (um sobe e desce de escadas que vale por uma musculação). Mas na hora que você vê um desfile com a SUA COLEÇÃO, SEU NOME, quando você vê um catálogo lindo ou uma peça que vendeu absolutamente tudo e não deu pra quem quis, ou quando vê alguém na rua usando uma peça sua, é extremamente gratificante!


TREND-SE: Tem que saber desenhar para se tornar uma estilista? E costurar?

GZ: Saber desenhar é importante, mas saber passar a idéia do que você cria é muito mais. Conheço uma estilista que faz uns rabiscos feios demais, mas ela é tão criativa e passa tudo de forma tão clara, que as peças dela saem lindas de morrer. Eu não faço croqui (até faço, mas não sou muito boa), mas faço desenho técnico no Corel Draw, que pro meu tipo de trabalho é bem melhor. Então é muito bacana saber desenhar, mas se sua cabeça fervilha e na hora de colocar o lápis em cima do papel você trava, procure a sua forma melhor de expressar isso. O mais importante é a criatividade. Hoje em dia algumas empresas exigem domínio de Corel Draw, Photoshop e Illustrator, mas eu não concordo, você pode muito bem direcionar um desenhista pra ele colocar no papel/computador as suas ideias. E quanto a costurar, você não precisa de fato saber sentar em uma máquina e sair costurando, mas o mínimo que você precisa entender são os processos de costura, conhecer os diferentes tipos de maquinário, pra que serve cada um, como cada tecido se comporta e qual o melhor máquina e acabamento pra cada um deles. Ou seja, não precisa necessariamente saber fazer e sim saber como deve ser feito, pois é você que vai determinar como sua peça deve ser feita (modelagem, pilotagem etc.).


TREND-SE: Atualmente, muitas garotas se formam em Moda, mas não conseguem emprego na área. Depois de se formar, qual a primeira coisa que você fez para que tudo desse certo e você não se desviasse do seu sonho?

GZ: Foco. A gente tem que ter um objetivo. Podemos até dar uma desviada se as coisas caminharem dessa forma, mas persistência é fundamental. E como eu já falei acima, nada vem fácil, você vai ter que batalhar muito pra conseguir atingir os seus reais objetivos. Vai ter que começar como estagiário, fazendo certos tipos de trabalhos que dão vontade de chorar, gritar e pensar "nossa, mas eu tenho tanto talento...". Mas é uma fase, todo mundo passa por isso. Depois você vai ser assitente de estilo... e aí é com você! Tem que fazer de tudo pra se destacar, mas sem querer passar por cima de alguém, claro. Você tem que se submeter a certos tipos de coisas em prol de um bem maior. E é nessa fase de estágios e auxiliar que você começa a criar a sua teia de contatos. E foi exatamente isso que fiz. Não foi uma primeira coisa, foram coisinhas que ao longo do caminho foram se agregando até eu ter certeza que estava pronta pra um passo um pouco maior (ser estilista de fato!). Ah, uma carta de indicação de professores ou conhecidos também conta muitos pontos.


TREND-SE: Uma mensagenzinha final para as que ainda têm dúvidas?

GZ: Não podemos desistir dos nossos sonhos e objetivos, nem por desânimo, nem por preconceito de pessoas leigas no assunto. Moda é um ramo muito gostoso de se trabalhar. Tem seus problemas, mas todas as áreas têm. Se você gosta de moda, mas não tem certeza de que é o que você quer, faça um curso que tem mais a ver com você e depois faça uma especialização em Moda. Por exemplo, você pode cursar Relações Públicas e uma pós-graduação em Moda para trabalhar na área da comunicação. Pesquise muito sobre os cargos e salários, e se seus pais ainda tentarem te convencer o contrário, negocie, converse bastante com eles, mostre suas pesquisas sobre a profissão. Nossos pais só querem o nosso bem - se eu fizesse o que meu pai sonhou pra mim, eu seria uma médica medíocre. E hoje ele tem muito orgulho de mim, diz pra todo mundo de boca cheia que a filha dele é estilista, rs! Sempre vão ter umas pedrinhas no caminho, mas desistir não pode. E tem que ralar... e ter pé no chão. Vai devagar, com humildade, que você com certeza vai chegar lá!

Muito legal, né, gente? A Gabi também tem um blog super interessante, no qual ela aborda assuntinhos que a gente ama e também os perrengues e dicas da vida de estilista. Pra visitar, é só clicar aqui.
E claro, quero saber se esses dois posts sobre a carreira fashion ajudaram vocês a se decidirem que profissão escolher! Comentem muitooooo, ok? :)

Beijometwitta, e muito obrigada mais uma vez, Gabi!

2 comentários:

Celi disse...

Amei o novo layout!

Beijos
Celi
www.casanovaeagora.wordpress.com

Gabriela Brito disse...

Nossa, que fofa ela!!!
Uma graça a forma que respondeu as perguntas...

Bom, eu já me decidi por moda no ano passado, mas é sempre bom ler mais. :)

Beijos.

 

ilustração por janelle burger | layout por jeskchan